Já era tempo de
escrever-lhes esta resenha mais do que atrasada. Durante muito tempo
eu quis escrever algo assim, mas nunca me tinha surgido a
oportunidade pra fazer isso. Mas considerando as circunstâncias e a
recente morte de um dos guitarristas mais emblemáticos do nosso
tempo, acho que agora é uma hora melhor do que qualquer outra.
Não deve ser segredo
pra mais ninguém a morte do Malcolm Young, fundador do AC/DC. A
notícia, apesar de não ser uma surpresa, não deixa de aparecer
como choque, principalmente devido ao modo como morreu. Não foi um
cliché do Rock N' Roll, morrendo de overdose, ou bêbado em algum
lugar (me desculpe, Bon Scott, não era tão cliché na sua época).
Ainda mais a personalidade calma e reservada dele nos fazia sempre
esquecer de quem era realmente a cabeça pensante por trás do AC/DC
e principalmente, quem realmente havia revolucionado o jeito de se
fazer Rock N' Roll, da forma mais pura, simples e direta que se tem
notícia até hoje.
Mas esse texto não é
mais uma daquelas homenagens simplórias a uma pessoa que nunca
conheci. Acho que essa é a hora mais sensata de se fazer algo que eu
venho querendo fazer há já um bom tempo. Resenhar o primeiro disco
do AC/DC.
Tarefa difícil,
principalmente quando se ouve esse disco à luz de tudo o que veio
depois. Além disso, porque resenhar um álbum lançado em 1976? (Em
1975, somente na Austrália). Mas ouvir com os ouvidos críticos um
disco tão antigo, e que teve tanta importância na história da
música, mais de quarenta anos depois do seu lançamento é sem
dúvida, no mínimo, uma experiência interessante.
Eu me lembro muito bem
da primeira vez que eu ouvi esse álbum. Só não lembro a época,
mas o dia está bem claro na minha mente. Eu devia ter uns doze,
talvez menos. Estava com uns amigos na casa de praia jogando
videogame (Tony Hawk Pro Skater 3, grande jogo) e de repente começam
os primeiros acordes de T.N.T., enquanto o vocal potente e delirante
de Bon Scott entrava nos meus ouvidos como uma bala cortando tudo,
como uma verdadeira explosão de pura adrenalina, mais do que
qualquer jogo de videogame seria capaz de me proporcionar. Eu fiquei
ali naquela tarde, jogando quase o dia inteiro, esperando
ansiosamente cada vez que essa música começava, e tentava (em vão)
fazer as manobras com botões, enquanto a guitarra de Angus Young
vociferava na minha cabeça de um jeito que nenhuma música tinha
feito até então. Era algo poderoso, mais do que qualquer outra
coisa que já tivesse acontecido comigo.
Eu já gostava de Rock,
sim, mas eram as bandas que estavam na moda na época. Era o início
dos anos 2000, Green Day e Offspring dominavam as rádios e os
pôsteres do meu quarto. E por mais que eu ainda seja muito fã
dessas duas bandas, nenhuma outra me pegou tão desprevenido e de
forma tão intensa quanto o poder do AC/DC.
Me lembro claramente do
dia em que perguntei pro meu amigo (que era também o dono do
videogame) que porra de música era aquela. Eu nunca tinha ouvido
nada daquele tipo. Nada tão clássico e atemporal. E ele me disse
quem era.
Na época o acesso a
internet não era tão simples, então eu tive que esperar pelo menos
algumas semanas até poder pesquisar sobre quem eram aqueles malucos
que eu tinha ouvido. E me deparei com a música T.N.T., ao vivo, já
com Brian Johnson. Isso me leva novamente a me lembrar de como é
interessante a primeira experiência que temos quando ouvimos uma
música nova. E principalmente, como é bizarro a forma como o AC/DC
é poderoso, como cada música nova, cada disco, cada show ao vivo
nos surpreende, nos pega pelos pés, nos põe de cabeça pra baixo e
nos enche de tapas na cara gritando no ouvido “Isso aqui é ROCK N'
ROLL”!
Aquele show que eu vi,
não me lembro até hoje qual era, me pegou de surpresa. Era Rock N'
Roll puro. Era clássico. Era eletrizante. Não consegui tirar aquilo
da minha cabeça. Mesmo quando eu ia dormir eu sentia minha cabeça
batendo no mesmo compasso.
E o primeiro álbum que
eu ouvi inteiro do AC/DC foi justamente o primeiro. Me parece que
eles não só chegaram na minha playlist como uma martelada na
cabeça. Foi assim no mundo inteiro. High Voltage é uma força
poderosa, uma coisa sem igual, podendo ser comparada somente com os
outros álbuns do próprio AC/DC. Tem tudo ali. Tudo o que uma grande
banda precisa ter. Sincronia, uma voz poderosa, uma pegada sem igual,
solos alucinantes. E principalmente, sem perder a compostura, tudo
muito bem marcado, tudo muito bem feito, com alma.
É isso. Rock N' Roll
com alma. Coisa que já não se vê hoje em dia, em época de
Instagram, bandas Nutella e sei lá mais o quê. Foda-se. Ouça a
música. Sinta o poder que aquilo pode te proporcionar. Esqueça do
celular, do computador, do seu ego ranzinza, da sua dor nas costas e
deixe a música te levar aonde ela me levou, enquanto balançávamos
nossas cabeças naquela sala de estar, na frente de um videogame
gritando “T.N.T.”!
E foi naquele dia,
quando eu ouvi o High Voltage pela primeira vez que eu soube que
queria tocar guitarra. “Porra, eu tenho que tocar tão bem quanto
esse cara”! Mal sabia eu que o cara que eu achava o melhor do
mundo, era na verdade o showman, o cara que aparecia na capa do
disco, enquanto que o irmão dele, recluso e reservado atrás do
palco era a verdadeira cabeça, o verdadeiro Guitar Hero (jogo que eu
nunca joguei, estava ocupado demais tocando guitarra de verdade).
Não me levem a mal, eu
sempre considerei o Angus Young um dos meus guitarristas preferidos.
E também não tenho nada contra Guitar Hero. Mas quando eu lembro
dessas histórias, das primeiras vezes que eu ouvi Rock clássico, do
show do AC/DC que eu fui em 2009 (história que fica pra outro
texto), não posso deixar de reconhecer a importância dessa grande
lenda que foi o Malcolm Young. O cara por trás do poder. O cara com
o poder nas mãos.
High Voltage é até
hoje um dos meus discos preferidos. Sempre ando com ele no carro,
junto de toda a discografia do AC/DC, enquanto tento acelerar,
xingando alto o velhinho do Corolla na minha frente que não sabe pra
que serve o pedal da direita. Porque convenhamos, quem realmente
consegue ficar parado com uma cerveja na mão ouvindo The Jack? (Se
dirigir não beba).
Mas depois de tudo isso,
depois de tudo o que eu disse nesse texto, não acho que há mais o
que falar. Sobre o High Voltage, o disco ainda está aí, é uma das
maiores obras-primas da história da música e ponto. Ouça e
confirme por si mesmo.
E pra terminar essa
resenha (que nem sei se posso chamar de resenha), só tenho realmente
uma única coisa a dizer que pode resumir tudo o que eu escrevi.
Obrigado Malcolm. Muito obrigado mesmo.